O precedente judicial merece respeito!


Lê-se notícia no "Consultor Jurídico" de 29 de outubro de 2015 que, conforme decisão da 13ª Câmara Cível do TJRJ (para ler a decisão clique aqui), escritórios de advocacia contratados sem licitação deverão devolver os honorários que receberam (clique aqui para ler notícia completa).

O curioso, no entanto, é o que vem por trás da notícia.

Isto porque o STJ já firmou entendimento contrário àquele manifestado no julgamento aqui mencionado.

Conforme destaca a própria notícia:

"A determinação vai de encontro à jurisprudência do STJ, que, no julgamento do Recurso Especial 1.394.161/SC, entendeu que os valores pelos serviços só não devem ser pagos em caso de má-fé."

Não quero entrar no mérito da questão, ligada muito mais ao Direito Administrativo, área na qual este blog evita transitar.

O que proponho é uma "leitura processual" dos fatos. Ora, se há entendimento firmado por uma Corte Superior (STJ), por que então um tribunal estadual decide de forma diferente?

A resposta é simples: o tribunal local poderia demonstrar que, no caso, o precedente citado é inaplicável, seja porque as situações são distintas (distinguishing), seja porque o entendimento está superado (overruling), justificando-se, é óbvio.

Pois bem.

O que merece destaque é que o julgamento proferido pela 13ª Câmara Cível do TJRJ fez o distinguishing, demonstrando que as circunstâncias fáticas do julgamento do REsp 1.394.161/SC pelo STJ são distintas daquelas presentes no caso posto a julgamento. Logo, o entendimento do precedente não valeria ao caso concreto.

Isso ser verdade ou não é fator de menor importância para esta abordagem. Os interessados (sucumbentes) recorrerão às instâncias adequadas. O que releva destacar é que o TJRJ, a meu ver, aplicou adequadamente a técnica processual. 

Com efeito, demonstrou conhecer o precedente e, além disso, sua inaplicabilidade ao caso concreto (distinguishing). Também poderia, se fosse o caso, afastar o entendimento por conta de sua superação (overruling). Só não poderia - e de fato não o fez - contrariar pura e simplesmente um entendimento, com fundamento na independência ou livre convencimento.

Vale destacar que esta orientação é seguida pelo Novo CPC (Lei 13.105/2015), conforme seus arts. 926 a 928, que transcrevo:

Art. 926. Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente.
 § 1º Na forma estabelecida e segundo os pressupostos fixados no regimento interno, os tribunais editarão enunciados de súmula correspondentes a sua jurisprudência dominante.
§ 2º Ao editar enunciados de súmula, os tribunais devem ater-se às circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua criação.

Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:
I – as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;
II – os enunciados de súmula vinculante;
III – os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;
IV – os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional;
V – a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.
§ 1º Os juízes e os tribunais observarão o disposto no art. 10 e no art. 489, § 1º, quando decidirem com fundamento neste artigo.
§ 2º A alteração de tese jurídica adotada em enunciado de súmula ou em julgamento de casos repetitivos poderá ser precedida de audiências públicas e da participação de pessoas, órgãos ou entidades que possam contribuir para a rediscussão da tese.
§ 3º Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica.
§ 4º A modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese adotada em julgamento de casos repetitivos observará a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da  segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia.
§ 5º Os tribunais darão publicidade a seus precedentes, organizando-os por questão jurídica decidida e divulgando-os, preferencialmente, na rede mundial de computadores.

Art. 928. Para os fins deste Código, considera-se julgamento de casos repetitivos a decisão proferida em:
I – incidente de resolução de demandas repetitivas;
II – recursos especial e extraordinário repetitivos.
Parágrafo único. O julgamento de casos repetitivos tem por objeto questão de direito material ou processual.

Independência e livre convencimento não podem, em resumo, servir de argumento para autorizar uma "decisão rebelde", que simplesmente contrarie o entendimento já manifestado por uma Corte Superior. A harmonia sistêmica está acima de tudo.

Bons estudos!


Prof. Denis Donoso

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