Corte de fornecimento de água do condômino inadimplente

O TJ-SP vem considerando lícita a atitude de alguns condomínios que interrompem o fornecimento de água do condômino inadimplente, afastando pleitos de dano moral decorrentes de tal prática (que seria, então, “exercício regular de um direito”).

Neste sentido:

“DESPESAS DE CONDOMÍNIO. Ação objetivando a composição de danos morais, em decorrência de corte de fornecimento de água. Cobrança dessa tarifa que vem discriminada no boleto de pagamento das despesas condominiais. Aprovação do corte por assembléia condominial. Corte do fornecimento que se apresenta legal, e não viola qualquer direito da apelada, de vez que inadimplente com as despesas do condomínio há muito tempo. Insustentável a r. sentença, pois a massa condominial não está obrigada a pagar por despesas de inadimplente, sob risco de se impor verdadeiro caos ao condomínio. Precedentes. Recurso provido, para fins de reforma da decisão.” (TJSP, 33ª Câmara Cível, Apelação 990.09.232060-2, rel. Des. CARLOS NUNES, j. 16.8.2010, v.u.)

Tal matéria é bastante polêmica, notadamente porque não é possível viver com dignidade sem fornecimento de água. Neste aspecto, a prática estaria vedada pela leitura do art. 1º, III, da Constituição. De mais a mais, tal conduta muito se aproximaria de autotutela, que é vedada pelo ordenamento, salvo nas situações expressamente autorizadas (a exemplo do que ocorre no art. 1.210, § 1º, do Código Civil).

De outro lado, recusar este expediente seria chancelar o inadimplemento das cotas condominiais, o que prejudicaria toda coletividade que lá reside.

A segunda posição, defendida no aresto acima exposto, parece-me mais coerente, pois é menos tolerante com a impontualidade perniciosa, encontrando repouso, entre outros argumentos, numa interpretação extensiva da Lei 8.987/95 (que permite que concessionárias de serviços públicos sejam interrompidos sob certas condições).

Aliás, como bem sintetiza NELSON KOJRANSKI: “se a concessionária ostenta legitimidade para interromper o fornecimento de água e ou de energia elétrica, o condomínio também pode repassar a sanção ao infrator. Até porque se esse inadimplente residisse em casa de rua, seria diretamente atingido pela interrupção. É de se admitir, pois, que o condomínio se comporta como intermediário entre a concessionária e o condômino consumidor.” (in Tribuna do Direito, ano 18, n. 216, abril/2011). Adiciono que, em se tratando de condomínio com individualização de fornecimento, a própria concessionária tomará a iniciativa.

Alguns requisitos, no entanto, devem estar presentes para cobrir de legalidade a atitude do condomínio:

a) prévio aviso ao condômino, não apenas do inadimplemento, mas da possibilidade de corte;

b) tratar-se de fornecimento uti singuli, ou seja, para uma unidade certa, não se estendendo a uma comunidade toda, uma escola ou hospital;

c) prévia aprovação da medida por assembleia condominial.

Com isso, se confirmada a orientação da jurisprudência paulista, tende-se a não criar responsabilidade do condomínio e, de quebra, reduzir a demanda do Judiciário.

Comentários

  1. Acho justíssimo o corte da água dos inadimplentes! No meu condomínio há casos de pessoas que moram nas coberturas, têm vários carros, filhos que vivem gastando em baladas, e não pagam o condomínio há quase um ano! As ações já foram ajuizadas, mas até serem concluídas, como se sabe, leva um tempão. Pelo que apurei, o corte da água não é total, mas o que chamam de "corte social", que permite ao devedor ter água suficiente para sua subsistência, sem permitir o uso de chuveiros, máquinas de lavar roupas ou louças, etc. Essa medida tem diminuido a inadimplência nos condomínios e os bons pagadores deixaram de pagar o consumo alheio. Em casos em que o devedor estiver em um momento de dificuldades financeiras, é sempre possível negociar o pagamento com a administradora do condomínio.

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